terça-feira, 15 de agosto de 2017

Artigo de Jadson Oliveira: "Navegar é preciso, mas o mar está revolto"



Jadson Oliveira é jornalista baiano. Trabalhou nos jornais Tribuna da Bahia, Jornal da Bahia, Diário de Notícias, O Estado de São Paulo e Movimento. Depois de aposentado virou blogueiro e tem viajo pela América do Sul e Caribe.







Foto acima, da Internet: A mobilização popular tem se mostrado insuficiente: bandeiras como ‘diretas já’ e ‘eleições gerais já” não prosperaram

O CAPITAL É INSACIÁVEL, DIZEM com razão os marxistas. Quando pensamos que os banqueiros e rentistas estariam satisfeitos com mais de 40% do orçamento da União (mais de R$ 800 bilhões anualmente), via a dívida pública, pensamos errado. Eles querem muito mais. Para isso deram o golpe.


De Salvador-Bahia – Continuando meu último artigo – Globo, Lava Jato, corrupção e criminalização da política -, vão aqui mais alguns dados da conjuntura brasileira. Atestam uma correlação de forças desfavorável à ação e mobilização dos setores democráticos, populares e de esquerda (e/ou centro-esquerda):
A criminalização da política atinge de frente o PT, mas a forte liderança popular de Lula resiste e faz o contra-ponto. Estão aí três ingredientes fundamentais para discussão:
1 – a política lulista de conciliação com os setores de poder efetivo: corporações empresariais multinacionais, banqueiros, agronegócio, latifundiários, empreiteiros (atualmente em baixa), mineradores e monopólios da comunicação;
2 – a política bem sucedida de inclusão social. Tal sucesso é o que incita o ódio das elites e seus caudatários da classe média. Acusações sobre corrupção são uma simples desculpa, pois os direitistas nunca se importaram com corrupção. Aliás, sempre a praticaram, como se fosse uma espécie de direito natural;
3 – a opção do PT pela prioridade eleitoral e a obtenção de êxitos eleitorais relevantes; mas, por outro lado, o abandono do trabalho de base e de politização das massas (como diz uma amiga, hoje quem politiza – ou despolitiza – o povo é a Globo). Ou seja, tornou-se um partido competitivo e vitorioso dentro das regras corruptas da velha política.
O desgaste atinge também outras forças de esquerda, incluindo os movimentos sociais, o que completa o quadro para uma mobilização de rua insuficiente. (Registro uma exceção: o movimento dos Sem-Teto em SP, que tem demonstrado grande força mobilizadora).
Tal desgaste é devastador na área sindical, também porque a militância desapareceu vitimada pela acomodação, desencanto e cooptação das lideranças, em decorrência da política “chapa-branca” da era Lula/PT. O poder mobilizador duma entidade como a CUT é hoje praticamente nulo.
Bolsonaro era impensável há quatro anos

O quadro não parece ser melhor no movimento estudantil, um setor de vanguarda de tão gloriosas tradições. Minha impressão é que um órgão como a UNE não tem hoje a mínima representatividade entre a massa de estudantes.
Sobre o campesinato, não tenho um juízo formado. Mas é visível que o mais importante movimento da área, o MST, já não tem o mesmo poder de fogo de antes.
O movimento de base da Igreja Católica, que sempre dialogou com mais eficiência com as comunidades populares, sofreu o baque da destruição da Teologia da Libertação e o consequente enfraquecimento das Comunidades Eclesiais de Base. Destruição patrocinada pelo papado de João Paulo II. Certamente que tal situação melhorou com o papa Francisco.
A ascensão das forças de direita e ultradireita, com a disseminação da cultura do ódio, é notável. Termômetro disso é o surgimento – impensável há quatro anos – de um Bolsonaro como candidato competitivo a presidente da República.
Movimentos sociais de direita, alguns inclusive de características fascistas – fenômeno também impensável há quatro anos –, botaram a cabeça de fora e ganharam as ruas.
Além do poder da direita desatado no Congresso, com o fortalecimento do chamado Centrão e das bancadas BBB (Boi, Bala e Bíblia), é notável o poder de fogo de minorias militantes de direita entre quadros institucionais do Estado. Entram aí juízes (inclusive ministros do STF), procuradores e policiais da PF.
Da hegemonia da direita e da corrupção no governo Temer creio não ser necessário falar.
Poder concentrado dos monopólios da comunicação

O que é fundamental destacar é que todo esse panorama terrível seria impossível – ou pelo menos bastante obstaculizado – se não contasse com o concurso dos monopólios da mídia hegemônica.
Mesmo com a força crescente da Internet e redes sociais, os meios de comunicação tradicionais, com a Rede Globo à frente, continuam com um relevante papel no processo de desinformação dos brasileiros. Sem contar que a Internet também desinforma.
Fenômenos midiático-judiciais como Gilmar Mendes, Sérgio Moro e Joaquim Barbosa seriam impossíveis sem a ação manipuladora da Globo & Cia. Manipulando um tema sensível e sempre atual como a corrupção. Manipulação, aliás, histórica: lembram o “mar de lama” de Getúlio e o “governo incompetente e corrupto” de Jango?
Está tudo dominado. Não importa se com Temer ou com outro qualquer da mesma cepa. Depois da entrega do pré-sal, da terceirização total, da regressão nas leis trabalhistas e da marcha batida rumo à destruição dos programas sociais da era lulista, vêm muito mais coisas por aí. Não está na fila somente a contrarreforma da Previdência, pois os “setores de poder efetivo”, como chamei acima, os que agem nas sombras, não brincam em serviço.
O capital é insaciável, dizem sempre os marxistas. E eles estão certos. Os donos do capital sabem aproveitar a correlação de forças favorável a seus interesses, mesmo porque foram eles e seus “empregados” que a construíram. E vão pra cima sem qualquer escrúpulo.
Na área político-eleitoral estão tramando, por exemplo, o parlamentarismo e o “distritão”, embutidos na chamada reforma política. O impedimento de Lula está em andamento. São desdobramentos “naturais” do golpe.
Na economia, estão “inventando” uma mina de ouro espetacular. Poderia se dizer sorrateiramente, mas o destemido senador Roberto Requião já botou a boca no mundo. Denunciou o escândalo da proposta de criação das chamadas “empresas estatais não dependentes”, mais uma boca rica para banqueiros e rentistas.
“Botou a boca no mundo” é força de expressão, pois os monopólios da mídia hegemônica nunca vão explicar esta maracutaia aos brasileiros. (Pergunto pela enésima vez: quando as esquerdas vão acordar e lutar pela construção duma poderosa rede de mídia contra-hegemônica?)
Quem explica tudo direitinho é Maria Lúcia Fatorelli, coordenadora do movimento Auditoria Cidadã da Dívida, no blog Conversa Afiada: https://www.conversaafiada.com.br/economia/fatorelli-pls-204-nova-maracutaia-do-serra-e-do-juca

E o próprio Requião, no seu site: http://www.robertorequiao.com.br/requiao-escracha-novo-golpe-do-mercado-financeiro-contra-o-interesse-publico/

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